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No Blog do Nêumanne: Os maus efeitos da pandemia, além da morte


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José Nêumanne

O novo coronavírus aumentou a popularidade de Bolsonaro, que o desprezou, agravou desemprego e desigualdade, fez mal à educação e pôs a nu a hipocrisia na pesquisa e no futebol

O diabo do novo coronavírus virou o Brasil velho da guerra pelo avesso. Médicos renomados, como Drauzio Varella, dublê de astro da informação científica na televisão, Luiz Henrique Mandetta, ministro da Saúde que deu início ao combate na União, e Davi Uip, que chefiou a equipe do governo paulista para enfrentá-lo, não alertaram para seus riscos. Assim, perdeu-se a oportunosa ensancha de reduzir efeitos de sua disseminação, mormente quando associados à promiscuidade de um carnaval de rua assassino em nossas grandes cidades. Reduzido a mero imitador do ídolo de sua vida, Donald Trump, o presidente da República, Jair Bolsonaro, abusou do diminutivo, chamando a covid-19 de “gripezinha”. Mal aconselhado pelas próprias limitações intelectuais, ignorou seu perímetro ventral, que nada tem de tanquinho, ao se dizer inexpugnável, por ser “atleta” e “valente”. E, aí, ele não passou incólume pelo contágio, mas a cura precoce autorizou seu vezo de homem do óleo de cobra das feiras do interior a propagar a hidroxicloroquina, droga tida como ineficaz contra a covid e capaz de agravar outras enfermidades mórbidas por experts.

Mas se algum brasileiro se beneficiou da pandemia e da consequente recessão econômica, foi ele. Os terríveis efeitos econômicos – o crescimento na casa dos milhões do número de desempregados, a perda do ano escolar agravando o péssimo cenário da instrução pública em tempo normal e a perda de renda de até 25% de quem se manteve ocupado – não prejudicaram o mais letal inimigo, que o capitão de milícias ignorou e favoreceu. Ao contrário, ele deu a impressão de que foi o único a alertar para a queda da economia, que vinha mal das pernas havia muito tempo e nunca deu sinais de recuperação. Permitiu-lhe a esperteza de superar a própria mesquinharia ao triplicar o auxílio emergencial, que seria de R$ 200 por mês e terminou sendo de R$ 600 após o Congresso ter aumentado para R$ 500. E isso aumentou os índices de bom e ótimo de seu governo na pesquisa Datafolha para 40%, 11 pontos acima do resultado de oito meses antes, quando sua péssima gestão o tornaria o maior culpado pelos números absurdos de velocidade de contágio e total de óbitos por qualquer tipo de medida que fosse adotada. O improvável vencedor da disputa eleitoral em 2018 tornou-se o favorito para se manter no lugar em 2022.

O chefe do Executivo, porém, não é o único vilão desta história sem mocinhos no faroeste do Brasil e quiçá do mundo. O populismo de esquerda da Itália malogrou miseravelmente, assim como sua versão direitista nos Estados Unidos, onde Donald Trump, ao contrário de seu fanático seguidor tupiniquim, vê ameaçada a reeleição, antes dada como certa. Os governadores e prefeitos, que ele acusou de carrascos dos pobres, pela crise econômica, também contribuíram para a piora dos índices sanitários e o consequente pavor econômico. O governador paulista, João Doria, e o prefeito paulistano, Bruno Covas, autorizaram o funcionamento de negócios e mantiveram espaços públicos fechados sem justificativa alguma. Wilson Witzel, do Rio de Janeiro, foi flagrado com a boca na botija, emulando o antecessor Sérgio Cabral, com a agravante de ser acusado de furto no superfaturamento de respiradores e na instalação de hospitais de campanha. O que provocou mais um efeito positivo para o chefão da União, tornado capitão da sesmaria da Guanabara.

O cidadão comum associou-se à tragédia generalizada, com 54% dizendo aos entrevistadores dos institutos de pesquisa apoiar o amplo isolamento social, como mandam o juízo e a ciência, mas o ignorando na prática. Com a atenuante de que não é fácil ficar, como tem ficado, seis meses em casa e até a calçada de sua moradia facilita aglomerações. Séculos de incúria tornam as calçadas da maior cidade do País impróprias para o distanciamento exigido por epidemiologistas – de 4,5 metros –, pois somente 2,7% delas o permitem.

Para completar, a imoral gestão da maior paixão popular, o futebol, entrou na esbórnia generalizada no calendário anual das competições. No Flamengo, campeão de tudo o que disputou no ano passado, a hipocrisia de seus dirigentes, exibida em rede nacional, causou o vaivém jurídico promovido pela própria inépcia na confecção de um “protocolo” que estava longe de ser “excelente”, como apregoavam. Após o reinício dos torneios que sustentam clubes, federações e confederação, o negócio do futebol conviveu mais uma vez com a distância absurda entre fatos e versões. Ao tentar anular a partida contra o Palmeiras no Allianz Parque, domingo 27, alegando contágio por covid de vários titulares, recorrendo à Justiça comum, o clube da maior torcida do Brasil foi flagrado em explícita tentativa de ser premiado pelo próprio grave erro. Para tanto apelou para uma razão humanitária, a contaminação de seus jogadores e funcionários. Isso após haver demitido o fotógrafo que flagrou sua delegação sem máscaras no voo fretado no qual voltava do Equador, onde se apresentou desfalcado para disputar a Taça Libertadores da América, sem reclamar.

Só que a covid-19 nada trouxe à tona que surpreendesse. O Flamengo já tinha sido negligente na tragédia do incêndio do Ninho do Urubu, que vitimou jogadores promissores de sua base. E até hoje, neste país da impunidade premiada, nenhum cartola foi punido por evidente omissão. Como Bolsonaro, ídolo de seus dirigentes, estes contaram com o esquecimento de sua desídia e com o heroísmo de jovens como o goleiro Hugo Moura, o melhor jogador em campo na partida que começou com meia hora de atraso. E isso devolveu ao torcedor um orgulho que os magnatas rubro-negros haviam transformado em náusea.

*Jornalista, poeta e escritor

(Publicado no Blog do Nêumanne na segunda-feira 28 de setembro de 2020)

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