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No Blog do Nêumanne: Os brutos também furtam


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José Nêumanne

Cara de sério e índole casmurra não evitaram que Serra juntasse R$ 40 milhões num banco suíço, algo impensável para um professor universitário, filho de um imigrante de classe baixa

José Serra, quem diria, acabou na Lava Jato.

Ou melhor, os brutos também furtam.

É possível afirmar que esse paulistano, de 78 anos, entrou na política pelas portas mais certinhas da História num século 20 conturbado por duas grandes guerras, fascismo, nazismo e comunismo, sangue, suor e lágrimas, como definiu magnificamente o maior estadista que atuou nele, o britânico Winston Churchill. No entanto, está deixando a cena da forma mais lamentável que poderia ter escolhido, depois de ter construído uma fama de gestor público reto e duro. De uma conta conjunta com a filha, Verônica, possivelmente a pessoa que mais ama, na Suíça das grandes contabilidades paralelas e dos códigos secretos de contas sem nome, foi bloqueada a quantia astronômica de R$ 40 milhões, grande até para os maganões da empresa privada que conviveram com ele em 56 anos de política.

Começou como militante da Ação Popular (AP), grupo armado que pretendia derrubar a ditadura militar, instalada exatamente depois de sua estreia em palanques no Comício da Central do Brasil (ou das Reformas), em 24 de março de 1964. Na presença do então presidente João Goulart, ele, presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE), deu apoio da juventude estudantil ao projeto de “reformas de base” do herdeiro político de Getúlio Vargas e líder do Partido Trabalhista Brasileiro. Uma semana depois, as famílias católicas fizeram passeatas contra a “ditadura sindicalista”, os generais se irritaram com a movimentação considerada subversiva de suboficiais e o general Olímpio Mourão marchou de Minas para o Rio, o que serviu de senha para o golpe. Então na Juventude Universitária Católica (JUC), foi para a clandestinidade e seguiu para o Chile, exilado. Lá conheceria Mônica, sua ex-mulher e mãe de Verônica.

Com a anistia, emprestou sua fama de durão ao primeiro governador de São Paulo eleito pelo povo pós-golpe, Franco Montoro, emedebista egresso do Partido Democrata Cristão (PDC). Secretário de Planejamento do Estado mais rico do País, foi um ponto de referência na economia, embora tenha estudado engenharia na Universidade de São Paulo (USP). Em nome do combate à corrupção do Movimento Democrático Brasileiro (MDB), entregue em São Paulo ao governador Orestes Quércia, juntou-se a Mário Covas, Fernando Henrique Cardoso e outros dissidentes no Partido da Social-Democracia Brasileira (PSDB). FHC nomeou-o, para surpresa geral, ministro da Saúde. Na sua gestão, deu força aos medicamentos genéricos e combateu com fervor antitabagista o tabaco. Foi ainda governador de São Paulo, prefeito da capital e perdeu duas eleições presidenciais, para Lula, em 2002, e para Dilma Rousseff em 2006.

Uma língua ferina diria que sua descida começaria no Ministério das Relações Exteriores do emedebista Michel Temer. Depois, passou a  ocupar uma das vagas no Senado, desde 2015, e foi pilhado com a boca na botija pela Operação Lava Jato, justamente agora, nos estertores dela.

Reagiu queixando-se publicamente da data de vencimento da investigação, argumentando que eventuais ilícitos estariam prescritos. Mas se esqueceu de negar a prática furtiva de corrupção. Os tucanos sempre foram favorecidos pela leniência do Ministério Público de São Paulo (MP-SP), incluindo a Lava Jato, sucesso em Curitiba e no Rio. Só que o saldo bloqueado grita mais alto do que qualquer queixa por ele utilizada em estilo sussurrante, que contraria seu perfil orgulhoso e antipático.

Há outro detalhe. A Operação Revoada, deflagrada em 3 de julho, joga luz num personagem já conhecido da Lava Jato, o lobista de fama internacional José Amaro Pinto Ramos. Este foi indiciado pelo Ministério Público da Suíça pelos crimes de lavagem de dinheiro e corrupção passiva de agentes públicos nos casos Alstom e Siemens, no governo do PSDB de São Paulo. Os esquemas do PSDB e do PT passaram por ele. Foi sócio de várias empresas do vice-almirante da Marinha Othon Pinheiro da Silva, ex-presidente da Eletronuclear, condenado em primeira instância pelo juiz Marcelo Bretas, da Justiça Federal do Rio, e delatado por diversos executivos da Odebrecht. Um dos 77 delatores do dito “Departamento de Operações Estruturadas”, nome pomposo para o propinoduto da empreiteira corrupteira, Benedito Barbosa da Silva Junior, confessou à Lava Jato que a Odebrecht pagou E$ 40 milhões ao lobista José Amaro Pinto Ramos para fechar o contrato de parceria com a empresa francesa DCNS para a construção de cinco submarinos. Othon Luís Pinheiro da Silva e o PT, por intermédio do ex-tesoureiro João Vacari, levaram propina. O negócio dos submarinos foi fechado, em 2008, por Lula.

Benedito Barbosa da Silva Junior confessou ainda que José Amaro Pinto opera no mercado de armas há muitos anos. A casa caiu para o lobista internacional do PSDB e do PT, ligado a Serra, Lula e às empreiteiras corrupteiras. Sua blindagem simplesmente derreteu.

Em 2017 comentei que o senador José Serra (PSDB-SP) poderia ter sido investigado a fundo em 2008, quando o Ministério Público da Suíça informou às autoridades brasileiras que havia indícios de que a multinacional Alstom teria pago propinas para obter contratos nas áreas de energia e transporte. Mas o procurador Rodrigo de Grandis, à frente do caso, engavetou o pedido da Suíça numa pasta errada!!! E não deu em nada para ninguém.

Esse caso de propina revelado agora e que é a base da denúncia do Ministério Público de São Paulo envolvendo o senador José Serra e as corrupteiras Odebrecht, OAS, Camargo Corrêa e Andrade Gutierrez, assim como o caso Alstom, poderiam ter sido investigados e punidos na Operação Castelo de Areia, anulada por intervenção do ex-ministro e advogado de Lula, Márcio Thomaz Bastos. Este pagou RS 5 milhões em propina e prometeu uma vaga ao então presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Asfor Rocha, no Supremo Tribunal Federal (STF) Mas Teori Zavascki foi nomeado por Dilma Rousseff para a vaga. Essa anulação atrasou o combate à corrupção em pelo menos oito anos. Blindou o PT, o PSDB e o lobista internacional José Amaro Pinto Ramos. A Lava Jato só foi um sucesso porque foi feita por Curitiba. Em São Paulo, território de Márcio Thomaz Bastos e seus advogados associados – cupinchas, melhor dizendo –, nada andou.

Agora vou além. O filho de Luiz Gushiken, Guilherme Gushiken, em delação premiada na Operação Greenfield, que apura em Brasília a corrupção nos fundos de pensão Previ, Petros e outros, confessou que a Camargo Corrêa pagou propinas milionárias ao PT e aos dirigentes da Petros. Pois é. Quantos crimes poderiam ter sido evitados se o Ministério Público de São Paulo tivesse agido? As corrupteiras são todas de São Paulo e formavam um cartel. Pegando uma, no caso, a Camargo Corrêa, na Castelo de Areia, pegavam todas. Como diz a metáfora de puxar uma pena e pegar a galinha inteira, da lavra do ministro do STF Gilmar Mendes.

O ex-governador de Pernambuco e ex-ministro da Fazenda Gustavo Krause escreveu-me a respeito das acusações contra Serra: “Nosso memorável Nélson Rodrigues dizia, com a licença que o talento lhe deu: ‘o que o sujeito tem de bom ou sublime está na cara’. Um exagero lombrosiano? Bom, além de uma chatice esculpida em granito, Serra era insuperável. Tinha o que chamo de ‘cara de critério’, máscara que parecia impenetrável aos peccata mundi”. E completou: “Eis que o ventilador cumpriu sua função e nós, nordestinos, a quem ele dispensava especial desdém, assistimos ao espetáculo da desfaçatez do ‘honorável tucano’. Que peste a corrupção! Ou nasce vacinado ou não há anticorpo que imunize”.

O saldo bloqueado da conta na Suíça, em que comprometeu a filha amada, ao estilo pós-petista, revela no sério só na aparência José Serra um traidor da memória impecável de dois antecessores tucanos dele. Franco Montoro, que o lançou na política. E Mário Covas, que não transigia com corrupção, terminou tornando possível a roubalheira ao fazer um trabalho notável na recuperação financeira do Estado mais rico da Federação, depois de Orestes Quércia, que levou o trio a deixar o MDB com o dr. Ulysses e tudo, ter dito: “Quebrei o Banespa (banco do Estado), mas elegi Luiz Antônio Fleury governador”. E assim foi feito.

*Jornalista, poeta e escritor

(Publicado no Blog do Nêumanne na segunda-feira 6 de julho de 2020)

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