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Lula, o cartomante que vira terapeuta

Lula tem talento para fazer do petróleo do pré-sal apelo eleitoral para sua candidata Dilma Rousseff, mas não de usar sua venda para tirar a maioria do povo brasileiro da pobreza

De manhã, em seu programa semanal de rádio Café com o presidente, falando diretamente para o povo, seu principal interlocutor na campanha permanente em que transformou seus dois governos, Lula qualificou a extração de petróleo na camada de pré-sal como uma “nova independência”. Foi, então, fiel à fantasia que criou para seu eleitorado cativo do “nunca antes na história deste país”, do “oba-oba” e do “vamos nessa”. À tarde, dirigindo-se a uma platéia seleta de convidados, adotou uma postura mais realista classificando o potencial de riqueza em matéria-prima fóssil para combustível de “dádiva de Deus”, mas que pode virar “uma maldição”. Ao amanhecer o dia, interpretou o cartomante da demagogia. Antes da chegada da noite, fez o papel do terapeuta da sensatez.
Essa personalidade dúbia é a faceta favorita do temperamento de noço líder genial do povo faminto, camelô de esperanças na feira das ilusões de um lado e psicanalista capaz de pedir juízo a seus clientes, aos quais transfere a responsabilidade pela própria cura. Como um feiticeiro tribal, ele receita a dança ritual para chamar uma chuva capaz de encher celeiros. E como aplicado discípulo de Freud, declara ao povo no divã que a responsabilidade será do paciente deitado, ao qual nega o direito de se queixar por ter acreditado no discurso ao feitio do pajé. O feiticeiro vende à tribo o elixir da bonança. Se, contudo, algo der errado, o terapeuta já avisou que isso poderia acontecer, não dependendo das vagas instruções que ele mesmo deu, mas da interpretação errada do livre arbítrio alheio.
Sabe-se que há petróleo na camada geológica do pré-sal e calcula-se que pode ser muito. O Brasil não dispõe ainda de tecnologia para extraí-lo nem de recursos para comprá-la. Tornar essa boa hipótese um fato insofismável por ora depende mais de talento político que de conhecimento técnico. E dificilmente na história da política se encontrará alguém que conheça tão pouco, mas seja capaz de, ainda assim, e até por isso, ser tão convincente. É esse o maior motivo da popularidade de Lula.
Mas esse talento não basta para garantir a metamorfose da fortuna a vir do subsolo em saciedade e felicidade para a maioria do povo. Sociedades que dispõem de petróleo à flor do solo prosperaram ou ainda vegetam. Isso depende menos da quantidade disponível do produto e da vontade dos governantes que da força das instituições. Os Estados Unidos são ricos porque têm petróleo abundante e instituições fortes. A Venezuela continua pobre porque a abundância de sua fortuna fóssil nunca amenizou a própria miséria institucional. O único brasileiro que na certa se beneficiará do pré-sal será a candidata Dilma Rousseff.

© Jornal da Tarde, terça-feira, 1° de setembro de 2009, p. 2A

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