Site oficial do escritor e jornalista José Nêumanne Pinto

Política


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Artigo no Estadão desta quarta-feira: República de bananas podres é de poucos

José Nêumanne

Governo compra parlamentares

para baixo clero corrupto ficar no poder

Desde 21 de abril o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), mandou a Polícia Federal (PF) investigar para descobrir financiadores e participantes de atos antidemocráticos que pregavam intervenção militar com Bolsonaro no poder. E o fechamento do Congresso e do “excelso pretório”. Na semana passada, a delegada encarregada, Denisse Dias Rosas Ribeiro, declarou-se incapaz de denunciar quem participou da subversão às portas do Quartel-General do Exército e quem pagou os fogos de artifício com que os fascistoides fingiram bombardear a sede do STF.

O ministro da Justiça do primeiro governo Lula, o criminalista Márcio Thomaz Bastos, tentou cobrir o sol com a peneira quando foi revelado que a PF fez escutas telefônicas não autorizadas pela Justiça de ministros do STF e do filho do ex-presidente. “É uma polícia republicana”, mentiu. Mas a PF não era guiada pela hierarquia funcional, e, sim, por petistas, liderados por Paulo Lacerda, que foi seu diretor, bem como da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), tucanos e viúvas do xerife Romeu Tuma. Há algum tempo, quem manda é Bolsonaro. Na sua facção milita o federal não identificado que delatou, segundo o empresário Paulo Marinho, ao então deputado estadual Flávio Bolsonaro que a Operação Furna da Onça fora adiada para evitar prejuízos à chapa de seu pai no segundo turno da eleição. E que o factótum do gabinete dele na Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj), Fabrício Queiroz, teve pilhadas em sua conta pessoal “movimentações atípicas” pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf).

O Grupo de Atualização Especializada em Combate à Corrupção (Gaecc) do Ministério Público do Rio (MP-RJ) reuniu provas de quatro crimes praticados pelo primogênito do presidente: peculato (uso de dinheiro público em benefício próprio), corrupção, lavagem de dinheiro e organização criminosa. Dos 22 membros, uma foi nomeada pelo atual procurador-geral do Rio, Luciano Matos. E as outras 21 nomeações estão no freezer. Cláudio Castro, governador de plantão no Rio, é íntimo da famiglia Bolsonaro, em especial do filhote 001. O novo chefe do MP-RJ foi o mais votado entre os colegas, liderando a lista tríplice que foi encaminhada a Castro. Não se sabe como será conduzido o inquérito, que sofre bombardeio pesado de órgãos da Presidência da República. O pai em pessoa chefiou uma reunião da Abin e o Gabinete de Segurança Institucional (GSI), para, no mínimo, apresentar queixumes das advogadas de defesa do acusado, que nunca apresentou um argumento documentado contra o libelo dos procuradores, sempre recorreu a órgãos superiores do Judiciário para paralisar e obstruir seu trabalho.

Esse não foi o caso do inquérito da delegada federal Ribeiro, que ignorou o princípio fundamental do Código de Processo Penal (artigo 197), segundo o qual fatos públicos e notórios dispensam provas. E ignorou atentados à democracia, tais como o bombardeio com fogos de artifício da sede do STF e o passeio do helicóptero de Bolsonaro com seu ministro da Defesa, general Fernando Azevedo (de óculos escuros, tradicional figurino dos tiranetes latino-americanos), em apoio a golpistas munidos de cartazes, faixas e gritos de ódio à cidadania. Idêntica foi a atitude do juiz Ney Bello, do Tribunal Regional Federal da 1.ª Região (TRF-1), ao encerrar inquérito sobre Frederick Wassef, ex-advogado de Flávio e lobista assíduo da intimidade palaciana, dispensado de explicar a presença do presidiário Queiroz em seu falso escritório de causídico de ocasião em Atibaia. Na decisão, ele foi acompanhado por Maria do Carmo, amiga de Flávio Bolsonaro e dada no STJ como madrinha de Kassio Marques, recente indicação do pai Jair ao STF. Dos bastidores brasilienses consta que Bello também é o favorito de Gilmar Mendes para o lugar de Napoleão Maia, recém-aposentado no STJ.

Essa dança macabra de cadeiras é rotineira em substituições de aposentados nos tribunais superiores. Da mesma forma, as emendas bilionárias de parlamentares foram assinadas pelo chefe do Executivo. Elas representam, contudo, muito mais o poder do Centrão do que a força do capitão artilheiro. O buraco, no caso, é mais embaixo: a garantia de impunidade para condenados, denunciados, acusados e suspeitos de corrupção. Isso confirma o que descreveu o desembargador paulista Fausto De Sanctis na série Nêumanne Entrevista em meu blog no portal do Estadão. Mais do que uma derrota das operações do tipo Lava Jato, trata-se de um retrocesso para as priscas eras a elas anteriores. Bolsonaro assume o aparente comando da operação “solta todos” porque ele, e não apenas os filhos, sabe o que fez no verão passado. É o que acusou, explicitamente, o deputado Kim Kataguiri, em outra entrevista dessa série.

Os ratos fugiram dos porões e subiram à torre de comando, onde o suposto capitão da nave a conduz para cruzeiro confortável, o mais distante possível das tempestades armadas pelas operações de combate à corrupção e às ações policiais contra o crime nesta república de bananas podres.

  • Jornalista, poeta e escritor

(Publicado na página A2 do Estado de S. Paulo na quarta-feira 3 de fevereiro de 2021)

Para ler no Portal do Estadão clique aqui.


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No Blog do Nêumanne: “Venha a nós, e ao vosso reino, nada”

José Nêumanne

Signo da generosidade franciscana virou lema de barganha de verbas por apoio, trocada pelo acréscimo à sentença da oração do Cristo na instauração da “democracia” sem povo dos populistas

Não há boa palavra que não possa ser distorcida e não acabe por expressar as piores intenções de quem nunca as teve boas. Nenhum filho de mulher tem uma biografia tão comprometida com a bondade, o desapego e o amor à natureza como o padre católico medieval, de família abastada e que viveu em plena, franca e santa pobreza: Giovanni di Pietro di Bernardone. Oito séculos depois de pregar suas melhores intenções, São Francisco de Assis, fundador da ordem franciscana e inspirador do nome do atual chefe da Igreja Católica, teve seu refrão mais célebre – “é dando que se recebe” – se tornado a inversão perversa e cínica para justificar a barganha vil e indecente de recursos públicos por proveitos privados.

Almir Pazianotto Pinto, que foi ministro do Trabalho e presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST), atribuiu a inversão do lema franciscano no Brasil contemporâneo ao deputado do PMDB paulista Roberto Cardoso Alves, Robertão, numa paródia para substituir, em 1988, a prática do que era, então, mais popularmente definido como “toma lá, dá cá”, mais curto, mais grosseiro, mais direto. Em artigo publicado no Correio Braziliense, à véspera do último Natal, Pazianotto usou de sua experiência e da vivência política para bordar na bandeira do hoje célebre e reinante Centrão a adaptação canalha da piedosa generosidade franciscana.

Em seu artigo que tem como título o lema atual do troca-troca, ele registrou, sem dó nem dolo: “A pulverização partidária, a ausência de compromissos ideológicos e a leviandade na administração dos interesses públicos, converteram a Câmara dos Deputados e o Senado numa espécie de supermercado, onde se negocia apoio ou oposição ao Poder Executivo. Palavra, assinatura, honra e dignidade podem ser comprados. Quando o presidente da República, de olhos na reeleição, à falta de liderança política e desprovido de partido próprio, pratica o toma lá dá cá, torna-se refém da Câmara dos Deputados e do Senado. É quando a negociação política de alto nível corre pelo ralo. Deixa de zelar pelos interesses da nação para se transformar em comércio de emendas parlamentares, de medidas provisórias, de ministérios, de diretorias de estatais e de sociedades de economia mista. Nessas circunstâncias, os presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado adquirem poderes excepcionais, porque, segundo o Regimento Interno, são senhores da pauta, da ordem do dia e da condução dos trabalhos”, escreveu, revelando algo que testemunhou. Em quatro anos de vigência, a Constituição “cidadã”, conforme afirmação de Ulysses Guimarães, que a presidiu, assim como ao partido em que Almir e Robertão militaram, criou o ambiente moldado à medida para esse figurino.

Hoje, 32 anos depois, tendo o Centrão se apoderado das transações nada republicanas que comandam nossos destinos, o principal líder do grupelho, criado e cevado no antifranciscanismo vigente, Arthur Lira, já encomendou uma nova bandeira e nela um novo lema para a indulgência plena de seus sócios proprietários. E, ao mesmo tempo, para a negação ao cidadão do princípio básico da teoria dos pais fundadores da democracia moderna, 500 anos depois do padroeiro dos humildes. Convidado a resumir sua proposta para a disputa da presidência da Câmara, não se fez de rogado e recitou à frente das câmeras sua versão do “Mateus, primeiro os meus”: sob sua chefia, a Câmara será do ‘nós’ e não do ‘eu’. Sua pretensão, claro, é projetar uma Casa mais plural e menos submetida ao poder do presidente, contrapondo-se ao antecessor, Rodrigo Maia. Mas, ao vê-lo e ouvi-lo frente a câmeras e microfones anunciando novos tempos para o País, lembrei-me muito mais da paródia popular à segunda invocação do Pai Nosso, oração por excelência do próprio Jesus Cristo (Mateus, 6, 10). Ao comentar o “venha a nós o vosso reino”, na Catequese sobre o Padre Nosso, o papa Francisco deu-lhe o significado que o pregador imaginou, ao ensiná-la aos fiéis: “o senhorio de Deus fez-se próximo dos seus filhos.”  Assim, como no caso do lema franciscano original do Centrão, seu atual sumopontífice, sem querer, querendo, como diria Chaves, terminou por permitir sua leitura correta com um provérbio nascido da prática da hipocrisia com o lema da antiga prática: “Venha a nós, e ao vosso reino, nada”.

Robertão morreu num acidente de automóvel há 25 anos. Ricardo Fiúza, citado como ele no lúcido artigo de Pazianotto, perdeu sua luta contra o câncer há seis anos em casa, no Recife. Eduardo Cunha, o mais bem-sucedido líder do Centrão, que os dois primeiros criaram, mofa numa cela de prisão em Curitiba, condenado por corrupção, à espera de que a benemerência da maioria do Supremo Tribunal Federal (STF) o livre, embora com a real intenção de limpar a ficha sujíssima de Lula. Ele deve orgulhar-se do mais leal dos discípulos: Lira deu um dos meros dez votos contra a cassação do ex-presidente da Câmara que cassou Dilma Rousseff, e não evitou o inevitável. Lira não deve ser acusado de excesso de franqueza por incorporar o próprio vademecum da impunidade para todos da grei, uma vez que ele não teve a intenção de avisar ao povo brasileiro que este está fora do pacto. Pois reservou tudo de bom e do melhor só para ‘nós’ do bando: perdão de penas, verbas parlamentares bilionárias e nomeação de parentes e apaniguados no novo torpe conluio do poder.

Evangelho quer dizer boa nova. No vademecum de Cunha e Lira a primeira pessoa do plural não se reserva ao “povo de Deus”, mas aos “eleitos” do próprio cabaré, que administra o inferno parao resto da Nação.

*Jornalista, poeta e escritor

 (Publicado na segunda-feira 1 de fevereiro de 2021 no Blog do Nêumanne)

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Artigo no Blog do Nêumanne: O inferno é aqui e Bolsonaro é seu capetão

José Nêumanne

Covid bate recordes de casos e óbitos, Congresso folga para eleger presidentes, STF suspende sessões, povo não pode ir às ruas, desemprego cresce e presidente vai a treino do Flamengo

Atrasado em relação a Reino Unido, União Europeia, Argentina, México, Chile, Israel e Índia, entre muitos outros países, o Brasil começou a vacinar profissionais da saúde, idosos em asilos, indígenas, quilombolas e penetras da elite governante no domingo 17. O governador de São Paulo, João Doria, saiu na frente, (1) porque tinha a Coronavac, sino-brasileira, com aplicação autorizada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) por cinco a zero; e (2) porque a Índia não entregou antes 2 milhões de doses da AstraZeneca-Oxford fabricadas pela Serum. Espumando de ódio, o presidente Jair Bolsonaro proibiu ministros de negociarem com paulistas e mandou polícia, órgãos de “inteligência” (aliás, burrice) e engavetadores amigos devassarem eventuais ilícitos do produtor do imunizante disponível, o Butantan, com 119 anos de ótima reputação.

Da justificada euforia pela ressurreição da esperança o cidadão brasileiro passou a soluçar de pânico ante a iminência de faltarem insumos para a produção em território nacional, com a insuficiência do produto imunizante: 10 milhões de doses para 212 milhões de habitantes. A incúria é recente. No ano passado, o atual governo negociou com a Pfizer, presente em EUA, Reino Unido, Europa, Israel, etc., 70 milhões de doses para 2021. Mas a compra não foi feita. E o Brasil perdeu lugar na fila, apesar dos alertas da própria farmacêutica para a elevada demanda pelo imunizante na pandemia. Em sua costumeira lorota de caixeiro viajante da “pílula do câncer”, o capitão cloroquina disse que quem quiser vender ao Brasil ofereça o produto. Agora quem paga a conta sabe que foi oferecido e recusado. A prioridade de gastos públicos no Brasil é comprar votos nas eleições para as presidências da Câmara dos Deputados e do Senado. Prioritário é o ódio preconceituoso do chefe do governo e de seu gado, que se deixa contaminar pelos perdigotos do “mito” (ou “minto”) perverso. Jamais a imunidade de rebanho, que poderá devolver a normalidade perdida ao povo, mero alvo teórico do populismo obscurantista.

A experiência brasileira recente em imunização data de 1962, no governo Jango Goulart, que declarou guerra à varíola, erradicada do território nacional desde 1973, em plena repressão do governo Emílio Médici, no recrudescimento da ditadura militar. Desde então, Ernesto Geisel, João Figueiredo, José Sarney, Fernando Collor, Itamar Franco, Fernando Henrique Cardoso, Lula da Silva, Dilma Rousseff, Michel Temer e, agora, Jair Bolsonaro caíram na lorota, cara aos chefões das organizações partidárias, de que melhor seria comprar vacinas baratas no exterior do que produzi-las no Instituto Butantan, de São Paulo, e na Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), no Rio. Enquanto isso, bilhões de dólares eram queimados no furto organizado dos governos petistas, cuja impunidade é garantida pelo populismo de direita do gabinete do ódio do capitão de milícias.

Justiça seja feita: o mundo todo passou a depender das poderosas indústrias farmacêuticas das populosíssimas China e Índia. E o Brasil, a mendigar a boa vontade das duas potências farmacêuticas, pois seus laboratórios de genéricos, criados com a quebra de patentes capitaneada pelo engenheiro-economista José Serra na gestão tucana, nada podem fazer, já que não produzem o procuradíssimo ingrediente farmacológico ativo (IFA). Nem detêm – ora direis, quem sabe até quando – a transferência tecnológica do IFA pela Sinovac e pela filial chinesa da britânica AstroZeneca. Os defensores da compra de vacinas baratas na China e na Índia se escafederam, escapando da justa fúria dos entes queridos dos mais de mil brasileiros que morrem por dia de covid enquanto seu IFA não vem. Na série Nêumanne Entrevista, publicada no Blog do Nêumanne do portal do Estadão, o ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta batizou de imunização “aos soluços”. Ou seja: chega vacina, aplica vacina, vacina acaba, para vacinação até chegarem novas doses, etc. A quem perde entes queridos por falta de vacina resta soluçar de dor e saudade.

Em Manaus e Porto Velho, brasileiros morrem afogados no seco. O intendente incompetente da Saúde, general Eduardo Pesadelo, refugiou-se às margens do Amazonas, com data incerta para voltar ao gabinete, para tentar fugir da mira do protetor-geral da famiglia Bolsonaro, Augusto Aras. Este pediu ao Supremo Tribunal Federal (STF) para investigá-lo por omissão criminosa pela falta de oxigênio. O petista baiano, que deve o cargo ao chefe do carregador de doses, ainda não foi informado (talvez porque tenha notório ódio à comunicação da verdade) de que o sinistro da doença apenas obedece a ordens expressas e públicas do capitão terrorista.

Deputados federais e senadores só pensam naquilo: a composição das Mesas que dirigem as Casas que, só em teoria, representam o povo. O chefe do governo conta com a eleição de dois paus-mandados. Um é o deputado Arthur Lira, figurão do Centrão e fiel anspeçada de Eduardo Cunha, o Caranguejo do propinoduto da Odebrecht, hoje cumprindo pena por furto qualificado. Contra ele, Baleia Rossi, do MDB, é frequentador assíduo de beija-mãos no palácio. E o senador Rodriguinho Pacheco enfrenta Simone Tebet, que se declara contra o impeachment de Bolsonaro, invocando o “sentimento do povo”, que não pode sair à rua na pandemia.

Ainda assim, o caloteiro, que não pagou as doses confiscadas do Butantan, as únicas disponíveis no Brasil até a chegada das adquiridas do laboratório Serum, abusa do recesso da cúpula do Judiciário, fingindo ser Caronte, o canoeiro que atravessa o Hades, rio da morte. Em plena alta do desemprego na recessão, gazeou o expediente em dia útil, invadindo na sexta-feira 22 o treino do Flamengo, imaginando-se acima do bem na condição de agente do mal. Por enquanto, panelaços e carreatas correspondem à queda da popularidade nas pesquisas. E, sobretudo, o mais importante: o pato pateta não conta mais com o patrão, Donald Trump, para dar aval ianque ao planejado autogolpe. Mais do que qualquer outro breve contra a ditadura da crueldade negacionista, pesará até 2022 Joe Biden na Casa Branca, fiel da balança de freios e contrapesos da ótima democracia.

*Jornalista, poeta e escritor

(Publicado no Blog do Nêumanne na segunda-feira 25 de janeiro de 2021)

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Nesta quarta-feira no Estadão: Graças a Deus, ainda há Anvisa em Brasilia

José Nêumanne

Por 5 a 0 agência de vigilância sanitária

resgatou vida e ciência e recusou culto à morte

Devotos do apóstolo Tomé, que exigiu ver o Cristo ressuscitado e tocar nas chagas da crucifixão para crer, tinham sérias razões para duvidar que a diretoria da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) autorizasse o uso emergencial da Coronavac, do laboratório chinês Sinovac e do Instituto Butantan, paulista. Seus cinco diretores foram indicados pelo presidente Jair Bolsonaro, que chama o imunizante de “vachina” e fez o possível e impossível para sabotar sua utilização na “campanha nacional de vacinação”, de ainda duvidosa existência, fiel à condição de artilheiro matador e a sua estúpida negação da ciência.
Tal dúvida tinha precedente a motivá-la. O diretor-presidente da agência, contra-almirante Antônio Barra Torres, apesar de médico, prestigiou, ao lado do chefe do Executivo, ato antidemocrático na Esplanada dos Ministérios, sem máscara nem distanciamento social, em 15 de março de 2020. Ficou claro na ocasião seu apoio aos golpistas bolsonaristas, expostos na ocasião em palavras de ordem, cartazes e faixas de ataque ao Supremo Tribunal Federal (STF) e ao Congresso Nacional. Os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia, e do Senado, Davi Alcolumbre, foram os nomes mais criticados pelos manifestantes. Em cartazes, parlamentares eram chamados de chantagistas. Um deles defendia fogo e álcool combinados para enfrentar o “vírus” do Supremo Tribunal Federal (STF). “Bolsonaro se aproximou dos manifestantes, fez selfies com o rosto colado e tocou nas mãos das pessoas. Em alguns momentos da transmissão do encontro, Torres apareceu filmando os cumprimentos entre Bolsonaro e os apoiadores presentes”, conforme relato dos repórteres do Estadão Jussara Soares e Mateus Vargas.

Imensa, portanto, foi a surpresa de telespectadores que, em audiência de transmissão de decisão futebolística, acompanharam a decisão histórica esperando o pior, caso do autor destas linhas, ao ouvir a abertura de Torres endossando as orientações da Organização Mundial da Saúde (OMS) no combate à pandemia: distanciamento social, uso de máscaras e higienização obsessiva. Estas foram adotadas pelo primeiro ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, e pelo governador do Distrito Federal (DF), Ibaneis Rocha, que, há dez meses, proibiu aglomerações. As recomendações dos técnicos deram o pontapé inicial nas dúvidas que ainda pairavam no ar sobre a votação.

A relatora, Meiruze Freitas, foi indicada pelo corpo técnico da Anvisa, com estabilidade garantida pela Constituição (conforme destacou o penúltimo diretor a votar), e indicou caminho similar ao dos apóstolos de Cristo na estrada de Emaús: aprovação da Coronavac com a garantia de acompanhamento da segurança pelos fornecedores e pela própria agência. Romison Mota e Cristiane Gomes, também nomeados pelo capitão cloroquina, acompanharam a relatora.

O quarto voto merece destaque. Foi de Alex Campos, que começou homenageando, de forma emocionante, os mortos por covid e seus entes queridos enlutados. Numa demonstração de coragem e gratidão, citou o ex-ministro Mandetta, em cujo gabinete serviu e por quem foi indicado ao presidente para preencher o cargo. E, last but not least, elogiou a independência no trabalho dos meios de comunicação, que, a seu ver, o servidor público deve respeitar. Sem perder em momento algum a sobriedade, deu uma aula de civilidade e responsabilidade e, garantida a maioria, afastou o fantasma do negacionismo, que pareceu fugir da sala.

No último voto, o presidente Torres jogou a pá de cal nas pretensões de quem o indicou para o posto e apostou na mortífera tentativa de desqualificação da imunização. Na sessão, de mais de cinco horas, o brado de independência foi: “Vá e vacine”. E só imunizar não deterá o avanço do contágio do novo coronavírus. A cereja do bolo foi a condenação explícita do “tratamento precoce”, codinome da devastadora hidroxicloroquina, que o charlatão-mor da República quer impor a médicos e hospitais do País.

A Anvisa deu o primeiro passo. Os secretários estaduais de Saúde se disseram no limite com o ainda chefe do governo. Em entrevista ao canal do autor deste artigo no YouTube, o ex-ministro da Justiça Miguel Reale Júnior disse que há mais motivos para impeachment agora do que quando participou do de Collor e foi coautor do de Dilma. O próprio capitão de milícias não se fez de rogado ao comentar a goleada de cinco a zero sofrida: “Não tem o que discutir mais”. E eximiu-se do dever de ofício de apoiar a imunização.

Isso faz lembrar a fábula do moleiro ao comentar a vitória sobre Frederico II, “sacro imperador da Prússia”, que tentou desapropriar seu moinho: “Ainda há juízes em Berlim”. Sim. Em Brasília há a Anvisa. Resta saber se ainda existirão no cerrado seco representantes do povo no Congresso e ministros da cúpula judiciária à altura de seus cargos para fazer o que urge: depor o capitão da morte Jair Bolsonaro por meios constitucionais. Isso já devia ter sido feito. Mas sempre será tempo de mudar e fazê-lo, como o fez Barra Torres. Agora, não. Já! Se qualquer dia for perdido, mais de mil brasileiros serão condenados à morte por omissão e inépcia de um governo assassino.

*Jornalista, poeta e escritor


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Artigo no Blog: Manaus sem ar, cheiro de morte e golpe

José Nêumanne

Governo ignora fim de estoques de oxigênio na capital do Amazonas, Bolsonaro não toma providências e ameaça com autogolpe a democracia, que evitaria chegar a 300 mil mortes na pandemia

Partindo de relatos no WhatsApp enviados por Edilson Martins, nortista, jornalista, meu colega no Jornal do Brasil, e Ophir de Castro, empresário brasileiro que mora na Flórida, reconstituo o relato de fatos que revelam os verdadeiros responsáveis pela tragédia da falta de oxigênio em Manaus: Jair Bolsonaro, o Rocinante, e Eduardo Pesadelo, o Sancho Pançudo.

Colunista pioneiro de meio ambiente, no Pasquim, periódico de resistência à ditadura militar, Martins escreveu no Facebook: “Os brasileiros, em razão da peste açoitando, sem controle, o país, passam a ser afugentados, recusados nas principais cidades do mundo. Viramos cães pirentos” (ou seja, com perebas).

Uma consulta rápida ao Google dá conta de que o governador do Amazonas, Wilson Lima, apoiou e foi apoiado pelo então candidato a presidente, Jair Bolsonaro, que teve na capital amazonense 66% dos votos válidos no segundo turno. Segundo Martins, “Lima pisou na jaca, entre outras acusações, ao contratar uma empresa que opera na área de vinhos, na compra de equipamentos inadequados, para combater a Covid-19. Só não respondeu a impeachment, até agora, pelos ilustres deputados da  Assembleia Legislativa, bom… cala-te boca”.

E Ophir lembrou que, “pouco antes do Natal, um decreto estadual proibiu a abertura do comércio não essencial em Manaus por quinze dias a partir de 26 de dezembro. Na manhã de 26, uma turba enfurecida, de verde-amarelo, protestou no centro de Manaus contra o decreto do governo. O governador Wilson Lima atendeu à plebe e autorizou a reabertura do comércio. Eduardo Bolsonaro comemorou: ‘1.º Búzios e agora Manaus. Todo poder emana do povo’. O deputado bolsonarista Daniel Silveira acompanhou o patrão: ‘E aí @wilsonlimaAM, viu quem manda no estado? Para com essa palhaçada de lockdown, senão vai ser arrancado do palácio pelas mãos do povo, literalmente. Recado dado e que os outros ditadorezinhos de porcaria entendam a mensagem. O poder emana do povo’, repetiu. A deputada Bia Kicis fez eco ao chefe no Twitter, ‘A pressão do povo funcionou também em Manaus. O governador do Amazonas, @wilsonlimaAM, voltou atrás em seu decreto de lockdown. Parabéns, povo amazonense, vocês fizeram valer seu poder!’. É a autora do PL 4650/20, que desobriga o uso de máscaras de proteção individual para evitar a contaminação por (sic) novo coronavírus”.

“Osmar Terra, médico, candidato a ministro da Saúde e defensor da cloroquina, postou na semana passada: ‘Embora noticiário alarmista, Manaus tem queda importante de óbitos desde julho, mostrando uma imunidade coletiva (de rebanho) em formação e se manteve assim até o último dia do ano’”, registrou o executivo.

No começo da semana passada, o intendente incompetente visitou Manaus, reforçou o tratamento precoce contra a covid-19 e disse que a prescrição da cloroquina pode ser feita pelo médico antes dos resultados dos testes. Daí veio a notícia nefasta: “Manaus vive colapso com hospitais sem oxigênio, doentes levados a outros Estados, cemitérios sem vagas e toque de recolher”. A média móvel de mortes no estado cresceu 183% nos últimos sete dias e num só dia morreram três médicos.

Sem oxigênio, Manaus não ficou em chamas, como Paris sob Hitler, no filme do gênio do cinema francês René Clément. O Ministério da Saúde mobilizou sete Estados para receberem 750 pacientes do Amazonas. Na quarta-feira, 13, uma aeronave levou oito toneladas de equipamentos hospitalares para a cidade, incluindo cilindros de oxigênio. Mas os estoques terminaram. Como é notório, o general Pesadelo comandou tropas do Exército e tem parentes na capital amazonense. Saiu dizendo que não havia o que fazer. No dia seguinte, os noticiários da TV registraram um brigadeiro no comando de aviões da Força Aérea Brasileira (FAB) levando pacientes manauaras para outras capitais e trazendo no voo de volta cilindros para atender quem não pudesse viajar.

Na live de quinta-feira, 14, Bolsonaro pediu calma, sem manifestar nenhuma empatia, sensibilidade ou solidariedade. Nem lamentar o luto das famílias atingidas. Como de hábito, transferiu a culpa para o governador do Amazonas e o prefeito da capital. OMas o hospital de referência para covid-19 é da Universidade Federal da Amazônia (UFAM), ou seja, da União. O Sistema Único de Saúde (SUS), subordinado ao Ministério da Saúde é, aliás, a única repartição pública federal que funciona na pandemia.

Em novembro, Bolsonaro vetou a compra de um jato da Boeing. Em janeiro, o governo pediu um avião da Força Aérea dos EUA  para transportar cilindros de oxigênio para Manaus. A White Martins, principal fornecedora de oxigênio, anunciou que deverá  trazer estoques do produto da sua fábrica da… Venezuela.

Aí apareceu o vice, Hamilton Mourão, e disse que a tragédia de Manaus foi imprevista. Em março de 2020, o então ministro da Saúde, Luiz Henrique  Mandetta, previu o colapso no sistema de saúde e o registro de 180 mil mortos por covid no Brasil. Ele foi demitido e o Ministério da Saúde cancelou as informações diárias das estatísticas em entrevistas coletivas. Os meios de comunicação obtêm os dados das Secretarias de Saúde e na manhã da segunda-feira, 18 de janeiro, o consórcio relatava que 209.906 brasileiros haviam morrido de covid.

Também no primeiro dia da semana o Ministério da Saúde, enfim, anunciou um plano nacional de imunização sem vacinas suficientes para tanto. Disponíveis só dez milhões de doses no País, graças a convênio do Instituto Butantan, paulista, com o laboratório chinês Sinovac, de setembro. Que o artilheiro mortal chama de “vachina”. O sinistro Pesadelo, que marcou o início para o “dia D, hora H”, viu o governador de São Paulo, João Doria, acompanhar a vacina sendo aplicada na enfermeira Mônica Calazans, de 54 anos, negra, corintiana, moradora de Itaquera, na periferia paulistana. O dia D virou dia do Doria. Da hora H nem Deus é capaz de dar conta. Ignorados pelo governo federal, os brasileiros contam com uma compra de 160 milhões de vacinas produzidas pela parceria Oxford-AstraZeneca com a Fiocruz. Ilusão! A vacina em questão é produzida pelo laboratório indiano, com insumos chineses (ou seja, “comunistas”), Serum, e este não liberou sequer os 2 milhões de doses que o governo brasileiro mandaria buscar em Mumbai num avião da Azul especialmente fretado para tanto. Não há calendário de vacinação nem perspectiva de produção da Fiocruz. As remessas de coronavac também podem não ser feitas logo pelo mesmo motivo: a escassez dos insumos da China. Ou seja, estamos acuados numa árvore da Amazônia pela cachorrada perebenta.

Sem vacina, humilhado pela Anvisa por cinco a zero e engolindo a vitória do rival que escolheu para disputa eleitoral, Bolsonaro resolveu ameaçar o País com a ditadura. Ao gado que o segue cegamente disse no jardim do Alvorada: “Nós, militares, somos o último obstáculo para o socialismo. Quem decide se um povo vai viver na democracia ou na ditadura são as suas Forças Armadas. Não tem ditadura onde (sic) as Forças Armadas não apoiam”, E ainda cometeu um ato falho: “Apesar das vacinas”. Xô, Bolsonaro, já! Antes que dê o autogolpe e continue boicotando a única esperança de fim da pandemia e da recessão, que é a “vachina”, que ele e seu gado desprezam por ignorância e arrogância.

QED (quod erat demonstrandum, o que havia de ser demonstrado)

*Jornalista, poeta e escritor

Publicado no Blog do Nêumanne, segunda-feira 18 de janeiro de 2021)

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No Blog do Nêumanne: O pato de Donald repetirá o patrão

José Nêumanne

Bolsonaro já avisou a quem interessar possa que seguirá modelo da invasão do Capitólio se perder a eleição de 2022 e não for adotado voto impresso, o que tem poucas chances de ocorrer

Duas notícias da semana passada, que aparentemente não têm relação entre si, revelam o alto risco corrido pela incipiente, mas até agora sólida, democracia brasileira de repetir autogolpes recentes da História da República: o de Getúlio, em 1937, e o da junta militar de 1969. O estancieiro gaúcho, que havia amarrado os cavalos da tropa no obelisco no Rio, em 1930, submeteu o movimento constitucionalista dos paulistas, em 1932, e assumiu a ditadura escancarada cinco anos depois, interrompendo a eleição presidencial em plena disputa entre Armando de Salles Oliveira e José Américo de Almeida. Após o impedimento do segundo presidente sob o golpe de 1964, marechal Costa e Silva, o vice-presidente civil, udenista e mineiro Pedro Aleixo, que se opusera ao Estado Novo getulista, teve a posse vetada, 32 anos depois, por uma junta militar. Composto pelo almirante Augusto Rademaker, pelo general Lira Tavares e pelo brigadeiro Márcio de Sousa Melo, o triunvirato escancarou a ditadura com “eleições” indiretas de três generais: Emílio Médici, Ernesto Geisel e João Figueiredo.

Em 7 de janeiro passado, o capitão terrorista Jair Bolsonaro anunciou, sem medo de ser feliz, ao comentar o fiasco do golpe de seu patrão ianque, Donald Trump, na véspera, Dia dos Santos Reis: “Se nós não tivermos o voto impresso em 2022, uma maneira de auditar o voto, nós vamos ter problema pior que os Estados Unidos”. Mais tarde, na live semanal de quinta-feira, insistiu: “Qual o problema nisso? Estão com medo? Já acertaram a fraude para 2022? Eu só posso entender isso aí. Eu não vou esperar 2022, não sei nem se vou vir (sic) candidato, para começar a reclamar. Temos que aprovar o voto impresso”. Eis a crônica do autogolpe anunciado, sem pudor, sem lógica e sem admitir contraditórios.

Em março passado, o presidente disse que apresentaria provas de que o pleito presidencial de 2018, vencido por ele, foi fraudado. Como de hábito, estava blefando: nunca apresentou sequer um indício de que o resultado da eleição tenha sido alterado de forma ilícita, contrariando a vontade do eleitor. Em novembro, seu patrão, Trump, perdeu a reeleição para o democrata Joe Biden por diferenças abissais: 74 delegados dos 50 Estados (306 a 232) e 8 milhões 59 mil e 741 sufrágios na votação popular (81.283.485 a 74.223.744). No entanto, abusou da “regra três” (como cantavam Toquinho e Vinicius no século passado), ao reclamar, sem provas, de ter sido “furtado”. Mas, como seu pato dos trópicos, o patrão ianque não revelou um indício de fraude que fosse, teve todas as ações rejeitadas nos Estados e não recebeu a proteção com que contava na Suprema Corte, onde seis dos nove ministros são conservadores, incluindo a última, que ele próprio indicou, Amy Coney Barrett ao arrepio da evidência de abuso pelos poucos dias que faltavam para o fim do mandato.

Como seu pato tupiniquim, o patrão abusado protagonizou um escândalo de dimensões ciclópicas ao pressionar o secretário de Estado da Geórgia, Brad Raffensperger, em telefonema de uma hora, revelado pelo jornal que denunciou o escândalo Watergate, The Washington Post. Carl Bernstein, um dos autores da reportagem, disse à CNN que esse caso ainda é mais escandaloso que o de Richard Nixon. No entanto, Trump o superaria ao convocar, em comício, uma turba de radicais lunáticos a invadir por quatro horas o Capitólio, sede do Senado e da Casa dos Representantes (equivalente à nossa Câmara dos Deputados), provocando o maior quebra-quebra institucional da História da democracia dos pais fundadores, desde 1776, há 244 anos. O mundo inteiro desabou sobre a cabeça do presidente dos EUA, com uma exceção. Mais uma vez, Bolsonaro não se fez de rogado ao comentar o vexame fascistoide de seu ídolo: “Você sabe que sou ligado ao Trump. Então, você sabe qual a minha resposta aqui”.

Haverá alguma instituição no País pronta para segui-lo na aventura para ter êxito imitando o malogro de Trump? Apesar de sempre insinuar e, às vezes, afirmar que as Forças Armadas estão com ele e de manter em cargos bem remunerados oficiais da ativa e da reserva, invejáveis boquinhas, talvez não conte com sua ajuda numa aventura antidemocrática para impor o voto impresso. Que só interessa a seus amigos das milícias cariocas e aos coronéis que ainda restam nos grotões, alguns deles do Centrão. Na verdade, ele conta mesmo é com as milícias armadas, que parodiam o lema de seu mais novo aliado secreto, Lula da Silva: “O povo armado jamais será vencido”. O apoio que alicia é das Polícias Militares estaduais. E, segundo reportagem de Felipe Frazão, do Estadão em Brasília, já há no Congresso, à espera de votação, dois projetos de lei orgânica das Polícias Civil e Militar restringindo o poder de governadores sobre braços armados dos Estados e do Distrito Federal. Ninguém pode deixar de agir por desconhecimento. Na reunião ministerial de 22 de abril de 2020, gravada e transmitida para todo o País graças à clarividência do ex-decano do Supremo Tribunal Federal (STF) Celso de Mello, Sua Insolência defendeu claramente armar o que ele chama de “povo”. E mais: o capitão de milícias, que prestigia todas as formaturas de academias de PMs, não perde uma oportunidade de declarar sua posição favorável à tal “excludente de ilicitude”, que, na prática, inocenta todos os policiais acusados de abuso de autoridade em confrontos armados em comunidades, sejam quais forem as circunstâncias. Menos ainda o por enquanto presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia. Pois seu pai, o ex-prefeito César Maia, invocou o próprio testemunho para lembrar que, no golpe facistoide de Pinochet, no Chile, os “carabineiros” tiveram tal importância que o ditador adotou a corporação como quarta força armada. Nenhum dos 70 projetos de impeachment do candidato ao autogolpe, contudo, sai da gaveta do filhote, que, aliás, nasceu no Chile, não foi?

*Jornalista, poeta e escritor

(Publicado no Blog do Nêumanne na segunda 11 de janeiro de 2021)

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