Site oficial do escritor e jornalista José Nêumanne Pinto

Política 2008/2007

A brasa a sardinha e a longa mão do gato

Renan não sabia que jamais se vai separar da pantera da ingratidão

Pode até ser tentadora, mas na certa também enganosa, a impressão de que o estado de decomposição do Senado desta República se deva exclusivamente ao processo de avacalhação a que a instituição foi submetida por conta do escândalo protagonizado pelo senador Renan Calheiros (PMDB-AL), que se licenciou da presidência e dificilmente a reassumirá depois do 45º dia, o último da licença pedida. Se também vier a perder o mandato, provavelmente ele não será vítima de uma injustiça atroz. Mas, ainda assim, não será justo considerar o episódio diferente de tantos outros que registraram a erosão da imagem do Senado, muito antes do que ora se passa. O que distingue o escândalo atual de outro, nada remoto, protagonizado por dois ex-ocupantes do mesmo lugar – Jader Barbalho, também do PMDB, e Antônio Carlos Magalhães, do DEM, ex-PFL – é o engano fatal de Renan de se haver considerado intocável, acima do bem, do mal e das vicissitudes da vida real.
Não lhe faltaram força nem cúmplices, que tivessem sobrado aos antecedentes citados, mas lhe faltou, sobretudo, a noção do perigo. Sua imprudência, resultante de uma ousadia excessiva, é subproduto não tanto de teimosia ou de temeridade, mas mais do salvo-conduto que ele imaginava ter recebido, quer pelo comportamento similar da maioria de seus pares e juízes, quer pela confiança na solidariedade da chefia do Executivo, à qual se habituou a render vassalagem, seja quem for seu ocupante. A cumplicidade dos iguais se provou efêmera ao ficar evidente: insustentável para ele, insuportável para os outros. Os pouco nobres serviços que prestou ao poder maior – caso da frustrada tentativa de evitar que Pedro Simon (PMDB-RS) e Jarbas Vasconcelos (PMDB-PE) votassem contra a CPMF na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado – não lhe bastaram. Ele não foi o primeiro nem será o último a fazer o papel de faxineiro pelo avesso: produzir a sujeira e, depois, escondê-la.
Como o alagoano, o paraense e o baiano se deixaram levar pela ilusão do poder absoluto, natural em quem se isola no alto da torre e perde o contato com o chão. Só que, mesmo tendo ultrapassado as fronteiras da decência e da prudência, Jader e ACM não queimaram as naves, qual Cortés, mas mantiveram o último laivo de lucidez e, aproveitando-se das brechas institucionais que garantem impunidade aos mandatários, renunciaram ao mandato, pulando do barco, para voltarem, apagado o fogo. Renan não repetiu esse recuo estratégico por ter confundido com covardia o que era só cálculo. Iludido pela pompa vazia de seu cargo, não levou em conta os próprios limites nem os reais interesses de quem o segurava no topo da escada. Aí, ficou no ar e perdeu o lugar.
ACM e Jader não receberam em seu embate as demonstrações de afeto e apoio que Renan recebeu após o primeiro discurso em que, da cadeira de presidente do Senado, tentou defender-se da acusação de ter transferido para um lobista de empreiteira o encargo de pagar pensão à filha fora do casamento. A fila do beija-mão que o seguiu não era desprezível: nela estavam o líder, Arthur Virgílio (AM), e o presidente nacional, Tasso Jereissati (CE), do principal partido de oposição, o PSDB. E também a lenda viva da correção política na Casa, Eduardo Suplicy (PT-SP). Em seu desvario de poder supremo apenas na aparência, pois este só lhe fora emprestado, não levou em conta a lição contida no soneto de Augusto dos Anjos: “A mão que afaga é a mesma que apedreja.” Por achar que poderia contar sempre com o espírito de corpo dos irmãos de opa, esqueceu-se de que os interesses que poderiam uni-los no início do processo os desuniriam quando viesse a lume a sucessão de denúncias da freqüente violação de leis de que tem sido acusado,
Assim como a solidariedade dos iguais, a cobertura de cima, com que contava, também seria fatalmente breve, como acabou de provar sê-lo. Com o devido respeito, um senador de participação pouco relevante na história política nacional, representante de um Estado também sem peso econômico ou político na Federação, poderia ter aprendido mais em sua experiência de saltar de galho em galho. Dificilmente um chefe de governo, de qualquer partido, iria até o ponto a que ele precisava que Lula tivesse ido para salvar o aliado das armadilhas que ele próprio armou sob os pés, antes de entrar no torvelinho das denúncias e nas tentativas vãs de se defender das acusações. Pensar que este iria até o fim foi a demonstração final de que Renan Calheiros não é um aplicado conhecedor de nossa História contemporânea. O presidente é um pragmático radical e tem por guia e convicção a caça instintiva a seus interesses e a competência para alcançá-los. Nunca teve problemas para jogar bagagem indesejável ao mar – fossem Alemão e Osmarzinho, à época das greves no ABC, ou José Dirceu e Antônio Palocci, no usufruto do poder.
Mais que dotado do teflon que impede que a sujeira produzida em seu nome ou a seu serviço lhe atinja a fatiota, Lula pratica com destreza o exercício de se proteger de pedras, ovos e tomates, mantendo-se sempre atrás de algum oportuno anteparo. Antes eram os citados no parágrafo acima, ontem foi o presidente licenciado do Senado, amanhã será outrem. Qualquer um vai gozar de imunidade até a hora em que algo indesejável venha a macular a luva calçada pela mão de dedos longos com que o gato alcança as sardinhas do poder sem que as brasas do jogo político lhe ponham em risco pele e pêlos. Não perceber que, neste país, ficar acima é privilégio intransferível de quem está por cima foi o tiro sem misericórdia no delírio de poder do pequeno ambicioso de Murici, que não soube cuidar de si por se imaginar capaz de se regalar sem se queimar. Agora, como relatou o poeta, “somente a ingratidão, esta pantera, será sua companheira inseparável”.

© O Estado de S. Paulo, quarta-feira, 24 de outubro de 2007, p. A2, Opinião

Os cúmplices do Monstro

Nem a família de Ademir Oliveira Rosário consegue entender por que lhe tem sido permitido sair periodicamente (uma dessas saídas chegou a durar 20 dias) da Casa de Custódia de Franco da Rocha, nome pleonástico do hospício penitenciário, onde vive, para visitá-la. Ele é um doido perigoso e seus parentes próximos sabem disso. Já foram relacionados pela polícia 21 adolescentes molestados sexualmente por ele. Os brutais assassinatos dos irmãos Francisco, de 14 anos, e Josenildo Ferreira de Oliveira, de 13, lhe valeram a terrível alcunha de “Monstro da Cantareira”.
Aos 19 anos, foi detido por 2 meses e liberado após ter sido condenado a 1 ano e 9 meses de reclusão, em regime aberto. Há 16 anos, cometeu o primeiro assassinato e por causa dele foi trancafiado na Casa de Custódia e Tratamento de Taubaté, da qual foi solto antes de ser julgado. Livre como suas vítimas em potencial, roubou e abuxou sexualmente de uma delas até que, em 1999, foi condenado a 7 anos pelo homicídio 11 anos de prisão pelo roubo seguido de atentado ao pudor. Se estivesse cumprindo pena, os irmãos Oliveira estariam vivos.
Mas não: o psicopata perigoso foi beneficiado por um programa de “desinternação progressiva” em São Paulo e transferido para perto de seus familiares, em Franco da Rocha, na Grande São Paulo. Em teoria, ele passaria a ser avaliado com severidade por especialistas em psiquiatria e criminologia e, por isso, pode passar temporadas com a família. Também em teoria, essas visitas teriam de ser vigiadas. Como se vê agora, tudo isso é uma fantasia. A juíza substituta Regiane dos Santos considerou letra morta os laudos dos especialistas, que alertavam para a periculosidade do interno e lhe deu licença para sair. Ele aproveitou para seviciar e matar meninos. Agora a juíza e a direção da Casa de Custódia calam sobre o sangue derramado, refugiando-se no expediente burocrático do silêncio imposto por sua condição funcional.
O “Monstro da Cantareira” não sabe o que faz. Mas só o faz porque o Estado brasileiro é negligente, insensível e incapaz. Os meninos foram mortos na Cantareira por um louco, mas quem o armou foi um sistema ainda mais insano que, em nome da proteção caridosa ao carrasco insano condena vítimas sãs e inocentes ao risco da morte impune. A juíza e os diretores do hospício deveriam ser condenados a a ouvir diariamente os gritos lancinantes de dor da mãe privada da companhia dos filhos. Até aprenderem.

© Jornal da Tarde, terça-feira, 02 de outubro de 2007, p. 2A

O STF contra a falta de compustura

O mandato não é do partido nem do parlamentar, mas do eleitor
O Supremo Tribunal Federal (STF) decidirá hoje se vale mesmo a interpretação adotada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) segundo a qual parlamentar que trocar de partido ao longo do exercício de seu mandato o perde, pois este pertence ao partido, e não a ele. Trata-se de uma decisão histórica, pois por ela o Poder Judiciário poderá se antecipar ao Legislativo numa questão capital, que é a da fidelidade partidária, primeiro ponto de qualquer reforma política ideal e principal causa real do fracasso de todas as mudanças propostas para as leis que tratam da organização dos partidos e da realização das eleições.
Se, como esperado, a Corte Suprema confirmar que o mandato não pertence ao eleito, haverá rebuliço de monta no Parlamento, pois cerca de 50 de seus membros correm o risco de ser cassados pelo fato de terem sido eleitos por uma legenda e de tê-la trocado por outra em plena vigência da legislatura. Os trânsfugas alegarão, não inteiramente sem razão, que o eleitor brasileiro não vota em partidos e, geralmente, nem em idéias, mas, sim, em pessoas. Então, uma decisão que obrigar o representante a ficar no partido pelo qual foi eleito trairia a secular tradição da escolha pessoal. Na verdade, contudo, esse argumento é falacioso. Pois ele parte do pressuposto equivocado de que o voto é uma espécie de carta-branca dada pelo cidadão ao parlamentar. E este, de posse do mandato que lhe é concedido, pode vendê-lo, alugá-lo, emprestá-lo ou doá-lo, como tem sido hábito desde sempre no Brasil – e mais ainda sob a vigência da Constituição de 1988. Esta instituiu uma espécie de parlamentarismo de resultados e de ocasião, no qual o legislador abre mão de sua prerrogativa de debater e votar as leis e normas que regem o destino da cidadania. E a substitui pela capacidade de barganhar vantagens pessoais ou para seu grupo em troca da transferência da carta-branca que lhe é dada pelo eleitor para o usuário da chave do cofre do Tesouro Nacional.
O grupo que comanda as finanças nacionais e governa por medidas provisórias, nem sempre necessárias ou urgentes, como ficou comprovado na retirada de várias delas em troca de uma tramitação mais rápida da tal Contribuição Provisória sobre a Movimentação Financeira (CPMF), aceita a chantagem sem choro nem ranger de dentes. Pois põe e dispõe sobre quem se diz representante da sociedade, em troca da distribuição de cargos e benesses da máquina pública, que termina, como sempre, custando muito ao contribuinte, mas nem tanto aos donos do poder. Se houver necessidade de criar mais cabides para pendurar os paletós dos senhores deputados, senadores, chefes partidários e seus apaniguados e cabos eleitorais, a burocracia federal pode provê-los com facilidade, contando para tanto com a cumplicidade dos colegas eleitos pelo povo para legislar. E sempre haverá a possibilidade de criar uma taxa, um imposto, uma contribuição ou ainda aumentar uma alíquota já existente para equilibrar a contabilidade federal, a fim de evitar quaisquer problemas de caixa.
O senador Wellington Salgado (PMDB-MG), suplente do ministro das Comunicações, Hélio Costa, e denodado membro da tropa de choque que defende com unhas e dentes o mandato do presidente Renan Calheiros (PMDB-AL), acaba de dar uma contribuição ao folclore da chantagem generalizada, ao reconhecer publicamente que seus companheiros de bancada querem apenas um “chinelinho” melhor. Para tanto contam com a enorme capacidade que o presidente da República tem de submeter o dicionário a seus desígnios. Enfurecido com a participação do PMDB na vitória de Pirro oposicionista da derrubada do castelo de sonhos do ministro Mangabeira Unger, Lula disse na semana passada que não “barganha”, mas “faz acordo”, tratando sinônimos como se antônimos fossem.
Pois, então, após ter lavado a alma da Nação ao aceitar, por unanimidade de votos menos um, abrir processo contra os 40 “mensaleiros” por formação de quadrilha em gabinetes oficiais, alguns dos quais bem próximos do presidencial, no Planalto, o Supremo pode agora repetir o feito. Para tanto basta não ceder à tentação de contemporizar, mais antiga ainda que a do voto personalista. A essência do poder na democracia é a vontade do representado, não as prerrogativas que esta possa dar ao representante. A fidelidade partidária não é uma fórmula mágica que moralizará da noite para o dia o conspurcado ambiente político nacional. Mas é o purgante que precisa ser ministrado para deter a decomposição orgânica da vergonha na gestão dos negócios públicos no Brasil, ilustrada pela demolição do castelo de areia entregue à administração de Mangabeira Unger. E pelo inchaço do Partido da República (PR), usado, como o PL, o PPS e outros no episódio da compra de adesão, inadequadamente batizado de “mensalão”, para garantir aprovação automática dos caprichos de el rey em Casas que em teoria deveriam ser submetidas à vontade soberana dos súditos.
A secretaria do faz-de-conta confiada ao ex-crítico rendido à pompa do pudê, como, de resto, muitos já o fizeram, é tão ridícula como quem foi escolhido para comandá-la. Mais ridículas, contudo, são as hordas brancaleônicas da oposição que, a reboque do fisiologismo do PMDB, a extinguiram para fazerem o povo imaginar que existe algum tipo de resistência que pode ser levada a sério às tentações totalitárias de Sua Majestade Metalurgíssima. Se a pasta de carochinha do professor Unger é uma concessão ao espírito carnavalesco de nossa República, a extinção dela, a serviço dos apetite pantagruélicos do general Renan e seus comandados, é uma piada de mau gosto que não deve ser contada nem em botequins de má fama. Ao STF caberá pô-la no devido lugar: o lixo da História.
© O Estado de S. Paulo, quarta-feira, 3 de outubro de 2007, p. A2, Opinião

Eleição é uma coisa; unção, outra

61 milhões de votos não põem Lula acima da democracia

Uma euforia cívica tomou conta do Brasil na semana passada, quando, por unanimidade, os dez membros do Supremo Tribunal Federal (STF) abriram processo por corrupção ativa contra – e apenas um deles não enquadrou por formação de quadrilha – o ex-ministro José Dirceu e mais 39 acusados de comprar a adesão de parlamentares aliados para projetos de interesse do governo. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva avisou logo que ninguém foi inocentado… nem inculpado. O truísmo presidencial certamente será insuficiente para retirar do julgamento a importância histórica e o incômodo que trouxe para seu governo e o partido em que milita. Mas também serve para alertar que esta decisão não é suficiente para dar um “basta” definitivo à impunidade reinante no País e enraizada na história, nos hábitos e nos costumes da sociedade – nem à permanência nociva dela nas engrenagens do Estado.
Sim: a histórica goleada que o goleiro Lula não quer admitir ter sofrido resolveu um jogo, empregando aqui uma metáfora tão de seu gosto pessoal, mas não decidiu o campeonato da impunidade. Ele próprio, contudo, pode ter-nos dado, sem querer, o caminho para desvendar e esclarecer a verdadeira importância daqueles votos que fizeram história. O observador desapaixonado terá dificuldade de entender por que o presidente não aproveitou a oportunosa ensancha para lembrar que a corajosa peça de acusação encaminhada ao STF foi da lavra de um servidor por ele nomeado e reconduzido ao cargo, Antônio Fernando de Souza, o procurador-geral da República. O relatório que acolheu a denúncia e encaminhou a votação também foi produzido por um ministro, Joaquim Barbosa, nomeado pelas mesmas mãos que conduziram ao plenário da cúpula do Poder Judiciário a maioria mais um de seus membros, seis em dez. Isso pode até ser debitado na conta do desgosto que lhe devem ter causado os votos dos ministros que indicou e que foram, como sempre, pressurosamente referendados nas sabatinas do Senado. Mas é mais provável que a lembrança lhe tenha faltado por desconhecimento de causa.
Talvez Sua Excelência não tenha percebido que a “vitaliciedade” (palavra desembarcada na linguagem corrente por culpa da sinecura confirmada pelo Órgão Especial do Ministério Público Estadual paulista ao promotor Thales Ferri Schoedl, que matou Diego Mondanez) é gêmea da independência. O general Charles de Gaulle dizia que a ingratidão é uma das maiores virtudes de que deve ser dotado um estadista. Talvez nosso presidente não conheça a sentença, mas tem uma biografia cheia de episódios que confirmam ser esta uma das qualidades que mais utilizou na escalada de uma diretoria do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo até o principal gabinete do Palácio do Planalto. Quem põe alguém numa cadeira que ele pensa ser maior que o ocupante deve estar sempre preparado para a possibilidade de o lugar exigir que ele cresça para ocupá-lo. Provavelmente o presidente da República e os 40 réus do “mensalão” não se tenham dado conta disso. Mas tudo indica que os membros do Supremo perceberam com clareza que a História lhes estava dando a oportunidade de ignorar o investidor para ficar no tamanho da investidura.
A ministra Ellen Gracie pôs indiretamente estas cartas na mesa quando lembrou, no encerramento da votação, que presidiu com brilho, que a história do STF o credencia perante a Nação por um “desempenho notável” no decorrer do tempo. No pronunciamento final dela e nos apartes de apoio que recebeu dos colegas Celso de Mello e Carlos Britto, ficou patente este compromisso do plenário do Supremo com a própria instituição, acusada de histórica leniência em relação à impunidade vigente – principalmente no que concerne ao julgamento de ilícitos de que têm sido acusados parlamentares e altos executivos federais aquinhoados com o foro privilegiado. Este zelo em relação à imagem da cúpula do Poder Judiciário, que o Senado não tem demonstrado no caso Renan e o Conselho Nacional do MP demonstrou honrar, ao corrigir a desastrada decisão corporativista do Órgão Especial do MP Estadual paulista, pode não bastar para garantir a punição exemplar para quem de fato delinqüiu no processo em debate. Mas pelo menos sinalizou que, mesmo tendo o acaso aquinhoado as duas atuais gestões com a nomeação de mais da metade de seus membros, o Supremo não fará vista grossa à marcha insensata que os maiorais petistas resolveram empreender contra a higidez das instituições democráticas vigentes. A popularidade de Lula não o põe acima delas.
Com a proverbial empáfia petista, o presidente fez o contrário do que fizeram os ministros do Supremo que nomeou e se apequenou apeando do trono presidencial onde o povo o pôs para exercer o papel, que não lhe é dado pela ordem constituída, de “perdoador-geral da república do PT”. Num encontro partidário, tomado pela certeza de que os 61 milhões de sufrágios que recebeu no ano passado o tornam portador do dom de ungir seus favoritos com o halo da santidade, mesmo quando eles cometem os mais graves pecados, Sua Excelência se deu ao desplante de dizer aos correligionários que não se deveriam envergonhar de seus companheiros processados pelo Supremo, mas se solidarizar com eles. Ungida pelo pai-patrão, o companheirada assumiu a vanguarda da marcha que tenta solapar as instituições, propondo absurdos, como a reestatização da Vale, e piadas de péssimo gosto, como a criação de um Conselho de Ética, sem que um só de seus ex-dirigentes e militantes tornados réus por corrupção e formação de quadrilha tenha sido sequer censurado. O passo do STF foi enorme e dado na direção e na hora certas, mas longa ainda é a caminhada para salvar as instituições do desmanche.
© O Estado de S. Paulo, quarta-feira, 5 de setembro de 2007, p. A2, Opinião

Lavando as mãos

A suspensão pelo Conselho Superior do Ministério Público da decisão tomada pelo Órgão Especial do Ministério Público Estadual de São Paulo, que manteve o promotor Thales Ferri Schoedl no cargo com todas as prerrogativas, entre as quais salário, aposentadoria e porte de arma, além de mandá-lo para Jales, onde sua vítima, Diego Mondanez, morou, lavou as mãos da instituição. É também esperta, pois o não à “vitaliciedade” dada (embora pela margem de apenas um voto), mais que a segurança dos cidadãos, salvaguarda a imagem da corporação, que goza desde 1988, quando foi aquinhoada com a condição de quarto poder pela Constituição em vigor, de muito prestígio na sociedade. Os membros do Conselho Superior, que nada têm que ver com a politicagem dos colegas paulistas, trataram de corrigir logo o erro.
Ao aceitarem a tese da “legítima defesa” de alguém que disparou 11 tiros contra um grupo de rapazes por motivo fútil, os promotores paulistas deixaram claro que, quando a questão atinge um de seus membros, eles podem ser tão sócios e cúmplices da impunidade reinante do País quanto quaisquer meliantes que acusam em nome da sociedade. A revisão determinada pelo órgão federal retira das mãos de um assassino confesso a arma que porta em nome do povo, mas mostrou também usar contra desafetos desarmados. Ela tem o condão de limpar a mácula na instituição justamente na semana em que o Supremo Tribunal Federal salvava a face do Poder Judiciário no histórico julgamento do “mensalão”. E confirma o passo correto dado pelos constituintes de prever um controle externo para a corporação.

© Jornal da Tarde, terça-feira, 04 de setembro de 2007, p. 2A

Uma esmolinha para Dr. Paulo, pelo amor de Deus

Quer ter uma idéia de o que e como é o Brasil? Exatamente no mesmo dia em que o promotor-matador Thales Schoedl foi “vitaliciado” pelos colegas; em que a Folha de S. Paulo publicou em manchete a queixa de Lewandovsky de que o STF teria aceitado a ação contra Dirceu “com a faca no pescoço”; e em que os amigos de Renan resolveram apenas para a CCJ do Senado e o STF contra a votação aberta do relatório contra o presidente do Congresso, os coleguinhas da Coordenadoria de Imprensa do STJ distribuíram a seguinte notícia:
Maluf receberá indenização de 100 salários mínimos
O deputado federal Paulo Salim Maluf receberá indenização no valor de 100 salários mínimos a título de indenização por dano moral a ser paga pelo jornal “O Estado de S. Paulo” e pelo jornalista José Nêumanne Pinto pela publicação e autoria do editorial intitulado “Viva o Voto”. O ministro Antônio de Pádua Ribeiro, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), negou a subida do recurso especial do jornal e do jornalista, que pretendia rever a decisão condenatória do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJ/SP).

Para o ministro, os recorrentes não rebateram, de forma específica, os fundamentos da decisão agravada, o que inviabiliza o acolhimento do agravo de instrumento para fazer subir o recurso especial de forma que o STJ possa rediscutir a questão

Segundo o processo, Paulo Maluf moveu ação de indenização contra o “Estadão” e José Nêumane Pinto, em razão de editorial intitulado “Viva o Voto!”, escrito pelo jornalista e publicado na seção Espaço Aberto, na edição do dia 26 de abril de 2000. O texto foi considerado pelo político paulista “um compêndio de enojantes insinuações e aleivosidades”. No texto, José Nêumane lamenta, comentando frase de Pelé, que “o voto direto não tenha livrado o Brasil de pragas como Maluf” e que “hoje a possibilidade mais concreta de Maluf e sua escola virem a ser castigados por malfeitorias em território nacional está nas mãos do FBI”. Para o jornalista, “as instituições brasileiras são tão lerdas e tolerantes que só há a possibilidade concreta de capturar um chefão de nosso crime político organizado se ele violar alguma lei americana – principalmente a da lavagem de dinheiro sujo”.

A sentença, do juiz de Direito Marcos Roberto de Souza Bernicchi, julgou a ação improcedente, condenando Paulo Maluf ao pagamento das custas e despesas processuais e honorários. Para o juiz, as expressões do texto são voltadas a convicções políticas e não à pessoa do autor, são voltadas contra a pessoa pública e não contra a pessoa íntima do autor. Para o magistrado, “o autor ficou conhecido por dizer frases célebres como “se está com desejo, estupra, mas não mata” e “professora não ganha pouco, é mal casada”, nem por isso foi processado por professoras e mulheres estupradas pelo simples fato de ter emitido opinião sócio-política.

A apelação de Paulo Maluf foi provida pela Oitava Câmara do Tribunal de Justiça de São Paulo, que considerou “abuso do jornal veicular editorial em que o apelante era achincalhado e adjetivado de corrupto, incompetente e irresponsável, cujo nome significaria administrar com o lema ‘rouba, mas faz”. Por unanimidade, os desembargadores condenaram o jornal e o editorialista a pagar indenização de 100 salários mínimos a Maluf com juros de mora de 0,5% ao mês desde a data da publicação até o efetivo pagamento, além de 20% de honorários sobre o valor final da condenação.

Daí o recurso especial de “O Estado de S. Paulo” e de José Nêumanne Pinto, que não foi admitido na origem, tendo as partes entrado com agravo de instrumento para tentar fazer a questão voltar a ser reexaminada pelo STJ. Mas, para o relator, ministro Antônio de Pádua Ribeiro, os recorrentes não demonstraram, de modo inequívoco, a contrariedade ou negativa de vigência dos dispositivos considerados violados pela decisão atacada, não bastando a simples alegação de que a lei foi contrariada para justificar o cabimento do recurso especial, sendo evidente que, para modificar a decisão do TJ/SP, seria necessário o reexame das provas colhidas no processo, o que não é possível no âmbito do STJ, por meio da via escolhida pelos agravantes.
Minha vontade é oferecer mais 100 SM pela propaganda de graça que os advogados do dr. Paulo estão fazendo deste jornalista.

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